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quarta-feira, 11 de abril de 2012

O (des)comportamento do consumidor

Um dos maiores desafios enfrentados pelas empresas que decidem tomar a sustentabilidade a sério é o enfrentado por aquelas que atuam no setor B2C (business-to-consumer, empresas cujos produtos ou serviços se relacionam diretamente com o consumidor pessoa-física). Como é natural, as mudanças nesse setor dependem muito (pró- ou reativamente) dessa entidade mística e transcendental que é o comportamento do consumidor. Como comunicar os atributos de sustentabilidade para esse consumidor? Como influenciar a preferência dele? Como o marketing pode incorporar esse aparente valor enxergado pelos consumidores?




A primeira reação para encontrar essas respostas é "Vamos fazer pesquisas!". E o resultados delas são sempre animadores: o que é mais bonito do que descobrir que 80% dos americanos planejam ser mais verdes no próximo ano? Ou que 68% concordariam em pagar mais caro por um produto "verde"? Investir nesse mercado é sucesso na certa! E aí começou surgir toda espécie de produto verde - os que plantam árvores, os que compensam carbono, os com embalagem mais ecológica, os com matéria-prima orgânica, os que protegem a floresta - e também toda sorte de greenwashing - as lindas imagens de cachoeiras ao lado dos produtos, colinas verdejantes, milhares de destaques em formato de folha nas embalagens. Tudo isso foi então recebido por entusiasmados consumidores, ávidos por dar sua contribuição para o planeta, certo?

Errado.

Produtos ditos "verdes" não venderam mais. Consumidores não estavam dispostos a pagar mais por uma embalagem reciclada ou reutilizável, ou para proteger a Mata Atlântica. O que os consumidores falavam nas pesquisas e o que efetivamente faziam na hora da compra era muito diferente. O "marketing verde" falhou.

Um artigo marcante deste momento foi o escrito por Joel Makower (autor de "A Economia Verde", uma influente obra sobre os rumos da sustentabilidade e editor do site GreenBiz.com) em maio de 2011, intitulado "Green Marketing is Over. Let's Move On" (O Marketing Verde Acabou. É Hora de Seguir em Frente - em tradução livre). Diz Makower: "(...) Depois de todos esses anos, o marketing verde não está fazendo nenhuma diferença real. Não está mudando os hábitos dos consumidores. Não está causando uma mudança significativa nos tipos de bens e serviços vendidos pelas empresas. E definitivamente não está fazendo a menor diferença para ajudar a solucionar questões como mudanças climáticas, segurança alimentar e de água potável, biodiversidade, preço da energia, ou qualquer outro de nossos sérios desafios econômicos e ambientais". Segundo Makower, os consumidores deixaram bem claro - não querem mudar. Pelo menos não em nome da Mãe Terra ou do bem maior. As escolhas de consumo e de estilo de vida mudam constantemente - mas essas escolhas nos beneficiam pessoalmente, hoje. Não alguma floresta em outro continente ou algum futuro distante.

Encarar a tarefa de influenciar os hábitos dos consumidores para escolhas de consumo mais sustentáveis - não apenas pelo bem do planeta ou da sociedade, mas porque isso tornará seu negócio maior e/ou mais rentável no longo (e às vezes no curto) prazo - não é, como se pode ver, nada fácil. A meu ver, esse objetivo passa por dois passos importantes: reconhecer os limites dessa mudança de hábito e comunicar adequadamente esses atributos.

Reconhecer os limites: Consumidores não abrirão mão de suas preferências tradicionais (preço, qualidade, conveniência, disponibilidade) por um produto sustentável. Considere-se tendo que escolher entre seu sabonete favorito e outro que (a) é 20% mais caro; (b) possui um aroma desagradável, por só usar certos componentes em sua formulação; (c) vem em uma embalagem que precisa ser compostada ou encaminhada a uma empresa recicladora específica; (d) só está disponível em uma loja especializada do outro lado da cidade. Pesquisa recente sugere que apenas 2% dos consumidores farão este tipo de sacrifício para ser mais sustentável. Para atingir todos os outros, seu produto precisa ser tão atrativo nesses parâmetros quanto seus concorrentes menos sustentáveis.

Comunicar adequadamente: A Unilever, a empresa em que trabalho, recentemente compartilhou suas Cinco Alavancas para a Mudança, um material muito interessante onde a companhia compartilha os princípios aprendidos por ela para inspirar, de forma prática, estilos de vida e comportamentos mais sustentáveis aos seus consumidores. Esses princípios são chamados de "alavancas", e vêm acompanhados de perguntas breves que ajudam a checar se a alavanca está sendo bem empregada:

1) Faça com que seja ENTENDIDO:
As pessoas sabem a respeito desse comportamento? Acreditam que é relevante para elas?

2) Faça com que seja FÁCIL:
As pessoas sabem o que fazer e se sentem confiantes em relação à mudança? Veem como a mudança pode se encaixar em suas vidas?

3) Faça com que seja DESEJÁVEL:
A adoção desse novo comportamento se adequará à sua autoimagem real ou aspiracional? Combinará com a maneira como se relacionam ou querem se relacionar com os outros?

4) Faça com que seja RECOMPENSADOR:
As pessoas sabem quando estão “acertando” o comportamento? Recebem algum tipo de recompensa quando acertam?

5) Faça com que se torne um HÁBITO:
Depois de as pessoas adotarem uma mudança, o que podemos fazer para ajudar na sua manutenção?


Uma abordagem de marketing/comunicação corporativa que leve em conta o reconhecimento dos limites para a mudança de hábitos que os consumidores estão dispostos a aceitar e que comunique esse incentivo adequadamente (como na metodologia apresentada pela Unilever) tem mais chances de influenciar positivamente o comportamento do consumidor, e colocar essa poderosíssima força a favor de uma transformação sustentável que seja boa para ele, para a empresa, para a sociedade e para o planeta.




*ATENÇÃO: todo e qualquer conteúdo publicado neste blog é de responsabilidade única e exclusiva de seus autores, e não representa o posicionamento ou opinião da Unilever Brasil ou de qualquer outra organização.

4 comentários:

  1. Oi Jorge,

    Realmente é ilusão pensar que as pessoas mudarão muitos dos seus hábitos por uma razão como o aquecimento global. Afinal, quem estuda mudanças fala que focar em um hábito de cada vez aumenta as chances da mudança permanecer.

    Assim, como sociedade, não é inteligente ressaltarmos inúmeros pontos de mudança ao mesmo tempo. Uma pessoa que não esteja muito envolvida vai acabar escolhendo ficar com a sacolinha plástica, separar o lixo quando dá, manter o carro e - o que é pior - ficar surda para quaisquer incentivos verdes.

    Se, por outro lado, demonstrássemos onde estão os 3 calcanhares-de-aquiles da sustentabilidade no Brasil e qual é a evolução dos seus indicadores por meio da internet, talvez tivéssemos mais adeptos, já que as pessoas saberiam que a ação delas faz a diferença. Talvez isso também gerasse compromissos empresariais focados, produtos com esses atributos e incentivos governamentais para prefeituras, empresas e cidadãos.

    O que você acha?

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    1. Oi Gabi!

      É bem interessante você levantar essa questão: de fato, um dos motivos pelos quais o Makower acha que temos que abandonar o marketing verde é que ele vira uma "distração" - as pessoas acham que já fazem a parte delas ao comprar qualquer greenwashing da vida e ficam surdas para as causas e problemas que realmente fazem a diferença.

      Como eu vejo, a maior razão para que as pessoas fiquem "surdas", é que muitas das iniciativas de mudança de hábito se baseiam na culpa para tentar influenciar o comportamento, geralmente com algum sacrifício por parte das pessoas. "O planeta vai acabar, não use seu carro!", "O planeta vai acabar, pague mais caro pelo produto verde!", "O planeta vai acabar, use essa roupa feia e desconfortável que foi feita de material reciclado", é o que a gente ouve por aí. E eu acho que a pessoa só vai até um certo limite pela culpa. O problema da camada de ozônio só "acabou" depois que vieram leis no mundo todo proibindo o CFC, e não porque os consumidores passaram a evitar em massa os aerosóis ou pagar mais caro por produtos sem CFC.

      Assim, acho que tanto as empresas têm que se esforçar para oferecer soluções tão boas quanto as que existem, só que mais sustentáveis, quanto acho que a comunicação de qualquer iniciativa de mudança de hábito tem que fugir da culpa, e passar de "apague a luz para ajudar o meio ambiente" para "Apague a luz, cada lâmpada que você deixa de usar te dá uma economia de X reais em sua conta, e você ainda ajuda o meio-ambiente". Ou, melhor ainda, fazer uma iniciativa com a companhia elétrica para dar descontos progressivos para quem economizar mais energia. E o fascinante é que toda mudança de hábitos traz muita oportunidade de negócio - venda de lâmpadas mais eficientes, sensores de presença para iluminação automática, etc.

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    2. Isso que falei na minha primeira resposta é especificamente sobre como acho que deve ser levada qualquer comunicação que vise incentivar alguma mudança de hábito para as pessoas - mas achei simplesmente FANTÁSTICA essa idéia de identificar os 3 assuntos mais relevantes para a sustentabilidade do Brasil (que na verdade seria praticamente como montar uma matriz de materialidade de um país inteiro!).

      Deixar claro o que é prioridade para a sociedade como um todo certamente ajudaria muito a agregar a massa crítica necessária para colocar governo e empresas para se mexer com força nessa direção. Você sabe de algum lugar onde esse tipo de coisa foi aplicado? Pensando rápido, acho que algo assim no Brasil teria que partir de alguma organização montada para este fim e que tenha muita credibilidade, não sei se vejo isso acontecendo dentro do governo, ou como iniciativa de uma empresa ou um setor. Mas é inspirador - vamos começar?! ;)

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  2. Ih... temo que haja um balde de água fria à espreita...


    Concordo em gênero, número e grau com ideia de conscientização en masse sobre as mudanças prioritárias, com foco.


    Por outro lado, o comportamento de massa é estimulado ou desestimulado pela repetição - o que na nossa sociedade, por diversas outras mazelas e desigualdades, é muito forte. A famosa racionalização: "não adianta só eu me preocupar... ninguém mais...".


    A estratégia teria, provavelmente, que passar por ações de grupos como as que já se vêem, mas com uma alavancagem grande o suficiente para que o comportamento seja observável pelas pessoas no dia-a-dia.

    SIZE MATTERS....

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